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A Polêmica sobre o Valor do ITBI nas Operações com Imóveis

Conceitos Básicos de Direito Tributário: Fato Gerador, Alíquota e Base de Cálculo

Antes de aprofundarmos no tema central, é essencial revisarmos três conceitos fundamentais do Direito Tributário: fato gerador, alíquota e base de cálculo.

  • Fato gerador é o acontecimento da vida real que dá origem à obrigação de pagar um tributo. Por exemplo, vender um bem implica a incidência de ICMS; uma doação, a incidência de ITCMD; e o falecimento de uma pessoa gera também ITCMD.
  • Alíquota é o percentual aplicado sobre a base de cálculo para se determinar o valor do tributo. Por exemplo: o ITCMD pode ser de até 8%, o ITBI varia entre 1,5% e 3% dependendo do município, e o ISS tem um mínimo de 2%.
  • Base de cálculo é o valor sobre o qual se aplica a alíquota. É um componente decisivo, porque mesmo uma alíquota baixa pode resultar em um tributo elevado se a base de cálculo for alta.

O Papel do Lançamento Tributário

No processo de constituição do crédito tributário, existe um ato fundamental chamado “lançamento”. É ele que formaliza o crédito e define todos os elementos do tributo: se houve fato gerador, qual a alíquota, qual a base de cálculo, quem é o contribuinte, quem são os responsáveis solidários, entre outros.

Esse lançamento pode ocorrer de diferentes formas:

  1. Por declaração – é a regra geral. O contribuinte informa os dados, como na declaração de imposto de renda.
  2. Por homologação – como no ICMS, onde o contribuinte realiza o pagamento e o fisco pode homologar ou não.
  3. De ofício – como no IPTU, em que a prefeitura envia o carnê com todos os dados já preenchidos.
  4. Por arbitramento – quando a autoridade fiscal não confia nas informações prestadas.

Arbitramento: Quando e Como Pode Acontecer

O arbitramento, segundo o art. 148 do Código Tributário Nacional (CTN), só pode ocorrer “sempre que” a declaração for:

  • Omissiva (não forneceu as informações),
  • Ou não merecer fé (quando há indícios de falsidade ou inconsistência).

Apesar do texto legal utilizar “sempre que”, essa expressão deve ser lida como “apenas quando”, indicando que o arbitramento não é livre, devendo seguir estritamente os critérios previstos.


O Caso das Holdings Familiares e o Valor Declarado

Um ponto delicado envolve a constituição de holdings familiares, quando imóveis são integralizados no capital social da empresa. Nesses casos, é comum que o valor usado seja o mesmo constante na declaração do imposto de renda, que geralmente está muito abaixo do valor de mercado.

Mas isso é legal? Sim.

Por quê? Porque o Estado brasileiro, por meio do artigo 142 do Decreto 9.580 (Regulamento do Imposto de Renda), autoriza expressamente que esse valor seja utilizado. Assim, ao usar esse valor declarado, não há omissão nem falta de fé pública – há, na verdade, respaldo legal.


Venda de Imóveis e ITBI: Qual Valor Usar?

Ao vender um imóvel, o ITBI (Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis) deve ser calculado com base no valor da operação declarada, ou seja, o valor real da venda.

Por exemplo: se um imóvel vale R$ 1 milhão no mercado, mas é vendido por R$ 850 mil, o ITBI deve incidir sobre os R$ 850 mil, desde que esse valor seja verdadeiro e declarado. Isso se dá porque o lançamento, como regra, é feito por declaração.

É comum que alguns municípios utilizem uma “tabela de valores venais”, cobrando ITBI sobre o maior valor. No entanto, essa prática não tem respaldo legal, pois o sistema tributário brasileiro é nacional e uniforme, devendo seguir os princípios do CTN e da Constituição Federal – não podendo uma lei municipal contrariar essas normas.


Quando o Valor Declarado Pode Ser Contestável?

O valor declarado só pode ser desconsiderado quando:

  1. For omisso – o contribuinte não declara o valor;
  2. Não merecer fé – há motivos objetivos e fundamentados para duvidar da veracidade da informação.

Um exemplo relevante foi o julgado do STJ sobre arrematação em hasta pública. O valor pago no leilão, autorizado por um juiz (representando o Estado), foi considerado legítimo para fins de base de cálculo do tributo. Ou seja, quando o Estado reconhece e valida o valor, ele deve ser aceito como verdadeiro.


Conclusão: Respeito ao Princípio da Legalidade e Segurança Jurídica

Ao discutir valores utilizados na base de cálculo do ITBI ou outros tributos patrimoniais, é essencial compreender que o sistema tributário brasileiro se pauta pela legalidade.

A autoridade fiscal não pode arbitrar valores de forma subjetiva, e o contribuinte que declara com base em regras legítimas e valores autorizados pelo Estado não está cometendo nenhuma infração.

Portanto, ao planejar a constituição de holdings ou realizar transmissões de bens imóveis, é fundamental estar ciente dessas regras. Isso garante segurança jurídica, evita cobranças indevidas e preserva o respeito às normas constitucionais e infraconstitucionais.

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