A Reforma Tributária trouxe a promessa de simplificação. Contudo, quando olhamos para o setor imobiliário, especialmente para a tributação sobre aluguel de imóveis, o que se percebe é exatamente o contrário: mais complexidade, novas regras e a necessidade de adaptação de empresários e profissionais que atuam no mercado.
Neste artigo, vamos entender como a Reforma impacta o aluguel de imóveis, quais tributos entram em jogo e o que muda na prática para quem recebe renda dessa atividade.
A Promessa de Simplificação x A Realidade
O discurso oficial da Reforma Tributária foi o de simplificar o sistema. Porém, no caso do setor imobiliário, a reforma trouxe novas camadas de dificuldade.
Antes, para calcular tributos sobre aluguel de imóveis em uma pessoa jurídica, a conta era relativamente simples: aplicava-se PIS/COFINS (3,65%) e depois se somavam os encargos de IRPJ e CSLL, chegando a percentuais já conhecidos e uniformes em todo o país.
Com a substituição desses tributos, entra em cena a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) e, mais à frente, o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), que substituirão PIS, COFINS, ICMS e ISS. Isso muda completamente a forma de tributar o aluguel de imóveis.
A Entrada do IBS e da CBS no Setor de Aluguéis
É importante destacar: o aluguel de imóveis não era sujeito a ICMS nem a ISS, apenas a PIS e COFINS. A Reforma, no entanto, determinou que o aluguel passe também a ser tributado pelo IBS.
Na prática, isso significa que uma atividade antes limitada a uma carga menor de tributos agora será alcançada por um novo imposto. Como consequência, a alíquota efetiva sobre o aluguel tende a aumentar.
Especialistas estimam que a soma de IBS e CBS ficará próxima de 28%, podendo variar em cenários mais otimistas (26,5%) ou mais pessimistas (30%). Porém, no caso do aluguel, há uma regra de redução: aplica-se apenas 30% dessa alíquota, o que, em termos práticos, ainda representa um peso maior que o modelo atual em boa parte dos casos.
A Transição: 2027 a 2033
O cronograma da Reforma prevê:
- 2027 – Extinção de PIS e COFINS, com a entrada da CBS.
- 2029 a 2033 – Saída gradual de ICMS e ISS e entrada do IBS.
Isso significa que, no aluguel de imóveis, a mudança será percebida em duas etapas: primeiro com a CBS (parte menor da alíquota total) e, depois, com a introdução gradual do IBS (parcela mais significativa).
Da Tributação Simples à Lógica de Débito e Crédito
No modelo atual, quem aluga imóvel aplica diretamente um percentual sobre a receita bruta. É simples e direto.
Com o novo sistema, surge a lógica de débito e crédito, típica do modelo de IVA (Imposto sobre Valor Agregado). Assim, toda despesa que tenha incidência de IBS ou CBS em etapas anteriores gera crédito tributário, que pode ser abatido do valor devido.
Exemplo prático:
- Custos administrativos ou comerciais da empresa podem gerar créditos.
- Serviços de imobiliárias que sejam contribuintes também podem gerar crédito.
Ou seja, a empresa precisará gerenciar com atenção os seus créditos para reduzir a carga efetiva. Isso exige controles mais detalhados e acompanhamento próximo da contabilidade.
Abatimentos da Base de Cálculo
Além da gestão de créditos, a Reforma trouxe novidades em relação às deduções possíveis da base de cálculo do aluguel:
- Redutor social: até R$ 600,00 mensais em contratos residenciais.
- Despesas dedutíveis: IPTU e condomínio poderão ser abatidos da base.
Esse ponto representa uma mudança significativa, pois atualmente a Receita Federal não permite deduzir IPTU e condomínio da base de PIS/COFINS, mesmo sendo valores que não compõem a renda efetiva do proprietário.
O Impacto no Fluxo de Caixa
Outra questão prática é o impacto no fluxo de caixa. O aluguel será tributado pelo regime de caixa (sobre o que foi efetivamente recebido), mas o locatário que seja contribuinte pode exigir o chamado split payment.
Nesse sistema, o próprio locatário recolhe o imposto na fonte para garantir o direito a créditos tributários. Na prática, isso transforma o inquilino em uma espécie de fiscal do governo e pode alterar a dinâmica de recebimento do locador.
Tributação na Pessoa Jurídica e na Pessoa Física
Outro ponto de atenção é que tanto pessoas jurídicas quanto pessoas físicas poderão ser enquadradas como contribuintes dentro das novas regras. Isso significa que, mesmo o investidor pessoa física, que aluga diretamente seus imóveis, terá que lidar com obrigações mais complexas do que as existentes hoje.
A Variação por Município
Um detalhe que torna o sistema ainda mais intricado é a possibilidade de variação das alíquotas conforme o município em que o imóvel está localizado.
Embora a CBS seja de competência da União e uniforme em todo o território nacional, a parcela do IBS pode ser alterada por estados e municípios a partir de uma alíquota de referência fixada pelo Senado Federal.
No cenário mais otimista, estados e municípios seguem a referência e o sistema se mantém uniforme. Já no cenário pessimista, cada ente federativo pode adotar percentuais diferentes, criando disparidades.
Na prática, isso significa que um investidor com imóveis em cidades distintas — como Florianópolis, Curitiba e Porto Alegre — poderá enfrentar alíquotas diferenciadas em cada município, o que aumenta ainda mais a necessidade de controle tributário.
Profissionalização da Gestão Imobiliária
A Reforma Tributária vendeu a ideia de simplificação, mas o resultado é um ambiente tributário mais complexo, que exigirá:
- profissionalização da gestão imobiliária,
- planejamento tributário estruturado,
- proximidade entre proprietário, contador e consultoria especializada.
Não será mais possível “terceirizar” totalmente esse tema ao contador. O conhecimento tributário terá que fazer parte da rotina de quem administra ou investe em imóveis.
Conclusão
A Reforma Tributária marca uma verdadeira mudança de paradigma para quem investe ou vive da renda de aluguéis de imóveis. O que antes era um cálculo relativamente simples — aplicação de percentuais fixos sobre a receita — passa a ser um sistema dinâmico, baseado em débitos e créditos, com regras de abatimento, redutores sociais e possibilidade de variação municipal de alíquotas.
Mais do que nunca, será necessário um olhar estratégico sobre a gestão tributária, acompanhando de perto não apenas as obrigações legais, mas também o impacto no fluxo de caixa e na rentabilidade real dos imóveis.
O cenário exige planejamento, profissionalização e acompanhamento especializado. Proprietários e empresas que se anteciparem, entendendo desde já como funcionam o IBS e a CBS e preparando sua estrutura para os novos desafios, estarão mais bem posicionados para atravessar a transição com segurança.