GS Escritório de Advocacia

A Tributação do Ágio na Subscrição de Cotas de Sociedades Limitadas no Lucro Presumido

O ágio na subscrição de cotas é uma prática comum em sociedades limitadas quando um novo sócio ingressa na empresa aportando valores superiores ao capital nominal. Essa diferença, registrada como reserva de capital, busca refletir a valorização patrimonial acumulada pela sociedade antes do ingresso do novo investidor. A questão que se coloca é: esse valor deve ser tributado pelo Imposto de Renda (IRPJ) e pela CSLL em sociedades limitadas, especialmente no regime do lucro presumido?


Fundamentos Jurídicos

O ponto de partida está no artigo 43 do Código Tributário Nacional (CTN), que define como fato gerador do imposto de renda a aquisição de disponibilidade econômica ou jurídica de renda ou proventos de qualquer natureza. Em outras palavras, apenas acréscimos patrimoniais com origem em capital, trabalho ou sua combinação podem ser tributados.

O ágio na subscrição de cotas, porém, não representa renda, mas sim uma transferência patrimonial dos sócios para a sociedade. Ele se aproxima juridicamente da integralização de capital social, que não é considerada receita, mas mera contribuição dos sócios.

Na contabilidade, seguindo os princípios da Lei das Sociedades Anônimas (Lei nº 6.404/1976, art. 182, §1º, “a”), aplicáveis por analogia às limitadas, o ágio deve ser registrado diretamente em reserva de capital, sem transitar pelo resultado do exercício.


A Polêmica da Aplicação do Decreto-lei nº 1.598/1977

O artigo 38, I, do Decreto-lei nº 1.598/1977 dispõe que o ágio na emissão de ações por preço superior ao valor nominal, registrado em reserva de capital, não será computado na determinação do lucro real. A redação, entretanto, menciona apenas “companhias” (sociedades anônimas), o que levou parte da Receita Federal a entender que o benefício não se aplicaria às sociedades limitadas.

Essa interpretação restritiva consta, por exemplo, da Solução de Consulta SRRF 8ª Região nº 195/1997, segundo a qual o ágio em quotas de limitadas deveria compor o lucro real, ainda que registrado como reserva de capital.


Decisões Administrativas e Judiciais

Nas decisões administrativas e judiciais sobre o tema não são pacíficas.

Em 2024, a Câmara Superior do CARF, última instância do tribunal administrativo, dobrou o número de decisões sobre o tema: foram 122 julgamentos, contra 61 em 2023.

Esse movimento reflete a estratégia da Fazenda Nacional de priorizar processos bilionários. No total, contando também as turmas ordinárias, foram 172 acórdãos em 2024, com larga vantagem para a União nos casos de ágio interno.

A polêmica está em duas frentes principais:

  • Ágio interno: operações dentro do mesmo grupo econômico. Desde a Lei nº 12.973/2014, sua amortização foi proibida, mas ainda gera disputas sobre situações anteriores.
  • Empresa veículo: criação de holdings para viabilizar investimentos, muitas vezes no exterior. A Receita costuma autuar operações quando entende que o único propósito foi reduzir tributos.

Em 2025, 47 casos já foram pautados até abril, com valores acima de R$ 15 bilhões. A tendência é que o CARF continue sendo palco central da disputa sobre ágio, mas com resultados incertos: depende da instância, do tipo de operação e da robustez das provas apresentadas.

Enquanto isso, no Judiciário, o tema também avança com decisões divergentes no STJ: a 1ª Turma foi favorável à Cremer em caso de empresa veículo, enquanto a 2ª Turma decidiu contra a Viação Joana D’arc em ágio interno.


Reflexos no Lucro Presumido

No regime do lucro presumido, a tributação se dá sobre uma base de cálculo ficta, determinada pela aplicação de percentuais sobre a receita bruta (art. 15 da Lei nº 9.249/1995).

Como o ágio na subscrição de quotas:

  • não transita pela DRE como receita operacional ou não operacional;
  • é lançado diretamente no patrimônio líquido (reserva de capital);
  • não integra o conceito de receita bruta previsto no art. 12 do Decreto-lei nº 1.598/1977;

conclui-se que também não há tributação no lucro presumido, pois não existe base legal que imponha sua inclusão na receita bruta para fins de cálculo do IRPJ e da CSLL.


Conclusão

O ágio na subscrição de cotas de sociedades limitadas deve ser tratado como transferência patrimonial, e não como receita sujeita à tributação. Tanto no lucro real quanto no lucro presumido, inexiste previsão legal que permita sua inclusão na base de cálculo do IRPJ ou da CSLL.

Assim, em termos práticos, as empresas no regime do lucro presumido podem registrar o ágio em reserva de capital sem tributação pelo IRPJ e pela CSLL, salvo eventual interpretação restritiva da fiscalização, que, em última análise, tende a ser revertida em sede administrativa ou judicial.

Rolar para cima